Seja minha vida o padrão naquilo que eu falar e no procedimento, o exemplo à todos levar.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

O sofrimento psíquico na sociedade de consumo


O sofrimento psíquico na sociedade de consumo
Publicado por: Karina Fatá Dahan em 19/4/2013
O sofrimento pode aparecer em qualquer circunstância da vida, em diversas formas de manifestação. O sofrimento pode estar ligado a uma perda, a dor física (manifestação somática), dor psíquica ou moral. Filósofos e estudiosos atestam, no decorrer da história da humanidade, que o sofrimento faz parte da condição humana, ou seja, que ele é constitutivo do humano. Portanto, se questionar sobre o sentido do sofrimento, seja ele qual for, é se questionar sobre a própria existência. 
Porém, como questionar o sentido do sofrimento, numa sociedade onde se vende a imagem da felicidade a qualquer preço? Onde a obtenção do prazer está em primeiro plano como mercadoria? Onde não estar feliz, falar de tristeza, de vazio, é vergonhoso. A sociedade de consumo em que vivemos desenvolve a cada instante, como mercadoria a ser consumida, dispositivos ideologicamente elaborados, para induzir o bem-estar, induzir a felicidade. Os sujeitos tentam corresponder aos modelos que a sociedade dita através da mídia, das redes sociais buscando corresponder ilusoriamente o que a sociedade indica como o caminho para a felicidade, ou a própria felicidade. As mercadorias consumidas oferecem status ao consumidor e são cada vez mais propagadas pela mídia. Sem contar à medicalização que cada vez mais trata todos os sintomas psíquicos como tendo uma prescrição orgânica. Assim, um sujeito que se julga ansioso e toma um medicamento voluntariamente, a fim de por fim a sua ansiedade, fica sem saber de que causalidade psíquica decorre seu sintoma. 

Estamos diante da tirania das imagens e diante de uma submissão alienante nesta atual sociedade. Imperando o mito da igualdade, onde o que é ditado pelo consumo, faz o sujeito se comparar e querer ter por uma questão de identidade. Claro, que assim, o sucesso material é valorizado e assim, temos como conseqüência a competitividade. Mito da igualdade, já que sublinhando a igualdade, estará acentuando as diferenças. O que é comprado é visto e mensurado pelos consumidores. 
Em 1930, Freud publica em Viena um livro inicialmente chamado de Das Unglück in der kultur (A infelicidade na cultura) e depois alterado para Das Unbehagen in der kultur (O mal-estar na cultura). Ficando em português como O mal-estar na civilização. Freud inicia o trabalho apontando o modo de pensar psicanalítico sobre a relação do homem com a natureza e com a sociedade. Ao se questionar sobre o propósito da vida, referindo-se aos próprios homens, levanta a seguinte questão “O que pedem eles da vida e o que desejam nela realizar?” E já 
responde sem dúvidas, que “Esforçam-se para obter felicidade; querem ser felizes e assim permanecer.” Vale ressaltar que a própria noção de felicidade é remetida a satisfação imediata das pulsões e é fundada sobre o princípio do prazer. 
Assim, esta busca da felicidade envolve dois aspectos: evitar o desprazer, ou melhor, a ausência do sofrimento; ou a busca de intensos sentimentos de prazer. Desse modo, qualquer situação desejada (pelo princípio do prazer), pode resultar no sentimento de prazer muito tênue ou na infelicidade; vai depender da nossa própria constituição. Porém, Freud afirma que experimentar a tal infelicidade não é tarefa difícil e aponta três direções por onde o sofrimento nos ameaça: de nosso próprio corpo, do mundo externo e de nossos relacionamentos com outras pessoas. Portanto, por que é tão difícil para o homem ser feliz? 
Passados oitenta e três anos em que O mal-estar na civilização foi escrito e publicado, percebemos que durante as últimas gerações, a humanidade efetuou um progresso extraordinário, na área tecnológica, nas ciências naturais, medicina etc. E mesmo assim, todos estes progressos não aumentaram a quantidade de satisfação prazerosa que poderíamos esperar da vida e não nos tornou mais felizes. Nas circunstancias em que Freud escreveu este texto e anos que se seguiram, a lógica que animava era a busca de uma liberdade, hoje temos uma liberdade em excesso e não sabemos como agir nela. O que fazer com tanta liberdade? Como ser feliz nesta atual sociedade? 
Das três fontes de sofrimento que Freud indicou, destaco aqui o corpo, como sendo o suporte dos afectos, das afecções e onde os sintomas são evidenciados. A psicanálise oferece ao paciente uma escuta diferencial, compreendendo como este sintoma se expressa, se manifesta através da fala. É no campo da interpretação que poderemos ajudar ao paciente a produzir sentido para o seu sintoma. Buscar a causa psíquica para as suas questões e assim que ele possa representar este sintoma que não mais pelo corpo e isto indicará um alívio para 
seu sofrimento. Visto que na cultura de consumo encontramos cada vez mais sujeitos insatisfeitos, esvaziados, sofrendo, porém nem sempre dispostos a falar de seus sofrimentos íntimos, preferindo se entregar voluntariamente a substâncias químicas. O poder da medicalização, portanto como um dos sintomas da nossa atual sociedade, que tenta abolir no sujeito o desejo de questionar sobre si e prefere o silêncio à fala.