Tendo acompanhado o inicio do processo de elaboração da antiga Lei Orgânica das Polícias Civis (2005), rebatizada como Lei Geral (2007), não me angustio com o posicionamento das entidades de classe que estão contra sua aprovação, na forma como esta proposta.
Ninguém mais legitimado que esses representantes sindicais, do maior contingente de servidores das PCs, para aderir ou repelir propostas que entendam boas ou ruins para o segmento.
O que perturba meus sonhos é a tentativa do Governo Federal em "empurrar" uma Lei que, antecipadamente, sabe, não irá contemplar os pleitos dos trabalhadores policiais.
O que inquieta as lideranças, nos debates ocorridos, são os posicionamentos de pessoas, ocupantes eventuais de cargos de confiança, que nem podem ser chamados de profissionais da área, já que nela atuam de forma eventual, arriscando-se a bancar idéias e alternativas que em nada organizarão as polícias civis brasileiras.
A partir do evento constitucional que impediu a ascensão funcional de um percentual de agentes policiais, por concurso interno, surgiu nas corporações a figura do delegado que desconhece a polícia e suas práticas. Já que para o desenvolvimento de sua carreira necessitará de muitos anos de atividade para compreender a corporação, seu funcionamento e a relação que necessita desenvolver com aqueles que, na prática, comandam as atividades policiais, já que as executam.
É sabido que os servidores que apuram os crimes e os relatam dominam, como ninguém, os processos executados na polícia civil. Assim como é aceito que aos delegados compete ordenar tanto essas investigações como os feitos cartorários, além de atribuições administrativas.
A relação necessária para que uma polícia investigativa melhore seus resultados exige que agentes e delegados tenham um comprometimento único e recebam tratamento isonômico dos governantes.
A hierarquia que deve prevalecer no dia a dia da atividade profissional numa delegacia de polícia não pode decorrer do título que ostenta um ou outro servidor.
Inexistindo um curso completo de formação policial que os capacite nos bancos das academias de polícia, já que os existentes são muito rápidos e superficiais, acabam completando essa formação no dia a dia de suas atividades. Apesar dos “pseudos” especialistas serem contra esta verdade.
São servidores que agregam elevado conhecimento na área em que atuam e nem por isso recebem reconhecimento. Na polícia, ainda, de forma equivocada, somente o delegado é valorizado.
A atividade policial, diferentemente da Judiciária, na qual a elaboração intelectual depende do Juiz de direito e do Promotor Público, responsabiliza pela investigação todos aqueles agentes que atuam na área operacional, entendendo-se ai a atividade cartorária e pericial.
Não é a elaboração intelectual assinada pelo delegado de polícia, no relatório final do inquérito, que irá absolver ou condenar um indiciado. Já que este documento apenas deve conter o relato da investigação realizada pelos agentes operacionais.
Por outro lado, sabe-se, de antemão, que não existe nenhum empecilho jurídico para a existência da carreira única nas Polícias Civis. O que poderia impedir esta ascensão seriam as avaliações e os cursos exigidos para que os melhores policiais chegassem ao final de carreira.
A tentativa do segmento de delegados em tornar sua "carreira" em jurídica esbarra numa obviedade primária: "A polícia civil será dirigida por delegados de polícia de carreira". Que carreira? Policial. Do contrário não poderiam ser dirigentes da Polícia Civil.
"As atividades de segurança pública não foram incluídas entre as funções essenciais à justiça, as quais dizem respeito às atribuições /cargos/ competências que efetivamente possuem natureza jurídica."A necessidade de ter conhecimento jurídico não tira do delegado a natureza policial.
Em sendo assim pode-se afirmar que a admissibilidade de carreira única na polícia civil interessa a todos, consequentemente exige a vontade Política do Governo Federal, em indicar Projeto de Lei que garanta uma estrutura organizacional, definindo a carreira única e o ingresso de todos policiais civis nos cargos iniciais, assim como ascensão funcional a partir de exigências legais e critérios transparentes.
A profissionalização da atividade policial passa pelo exercício da função de forma plena. O profissional para chegar aos cargos de comando deverá ter uma vivência que lhe oportunize prestar um melhor serviço à população.
Sei, por outro lado, que a cultura nacional sobre polícia é totalmente inexistente. A sociedade brasileira percebe-nos como nos tempos da colonização. Ainda somos vistos como "capitães do mato". Alguns policiais, em dado momento, até acham isso bom. Na realidade trata-se de uma visão equivocada, injusta e retrógrada.
Seria preciso, a nosso ver, um movimento articulado, convincente, forte e permanente. Primeiro, internamente, para padronizar as posições dos policiais. Em seguida, o enfrentamento público, através da mídia, mostrando a responsabilidade do Governo Federal e dos Governos Estaduais pela culpa exclusiva de não estruturar uma polícia capaz de reduzir os índices de violência que a todos angustia.
Não existe culpa dos policiais e das polícias. Culpados são os governos que há décadas entregam viaturas, armas e pequenas melhorias em prédios, alegando que tais ações irão ofertar melhores condições de trabalho. Mentira. São reposições que nada acrescem ao contingente ou as condições existentes.
Isto a mídia não repassa e não discute com a população. Enquanto usarem a figura de alguns delegados de polícia para os socorrer com desculpas e promessas que não reduzem os níveis da violência e criminalidade, em troca de uma promoção ou cargo, continuaremos assistindo o derramamento de sangue que hoje constrange o Brasil e os brasileiros.
Sem esquecer, apenas para registro, da necessidade dos policiais militares saírem das assessorias e dos quartéis colocando todo seu contingente em atividade de rua, ostensiva e preventivamente. Se tudo continuar sendo feito do mesmo jeito salve-se quem puder.
JORGE LUIZ DE QUADROS
Advogado
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